quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Professor-amélia... é só o que me faltava...

Tem dia que acho que estou fazendo a coisa certa: ser professora. A maior parte dos meus alunos se tornam meus amigos, me divirto com eles. Ensinar torna-se um ofício prazeroso, divertido e percebo que tenho conseguido alcançar meus objetivos: compartilhar meu conhecimento.
Outras vezes me pergunto onde eu estava com a cabeça quando decidi ser professora. Que alunos são esses que querem tudo menos estudar? Que famílias são essas tão desestruturadas e tão irresponsáveis em relação aos filhos? Que governo é esse que prioriza uma merda chamada quantidade e esquece da qualidade?
Hoje eu estava lendo o jornal Tribuna do Planalto e me deparei com uma entrevista interessante realizada com Ademir Luiz da Silva, doutor em História, professor da Universidade Estadual de Goiás e da Faculdade Alfredo Nasser. Vou reproduzir aqui alguns fragmentos que mais gostei:

Jornal: Por que o senhor argumenta que a imagem de "missionário" em torno do professor do Ensino Básico não é bem vinda?
Professor: Um missionário faz o que faz por abnegação pessoal. Não precisa nem espera ser reconhecido ou recompensado por seus sacrifícios. Há décadas os professores estão sendo tratados assim. [...] O discurso missionário que impregna a Pedagogia moderna faz com que o professor aceite atribuições que não são suas, obriga-o a embarcar em missões impossíveis, leva-o a sentir-se culpado por fracassos que não são seus. (Eu: O governo adora fazer propagandas sobre constantes cursos de formação de professor - o único responsável pelo sucesso/fracasso dos discentes. Será que os políticos se esquecem de que os alunos também deveriam ser preparados psicologicamente para serem estudantes??!)
[...]
Jornal: Essa condição missionária não prejudica a superação de fatores como a violência escola contra ele próprio, por exemplo?
Professor: Com certeza. De missionário rapidamente se passa a mártir. Os professores brasileiros estão sendo transformados em amélias. Pessoas que acham que é bonito, que é heroico sofrer. Estão sendo levados a acreditar que quanto pior suas condições de trabalho mais digna é a atividade. Mera falácia. (Eu: Professores-amélias é a mais perfeita descrição do que o governo tem tentado nos transformar!!! Ei, políticos: EU NÃO SOU PROFESSORA -AMÉLIA!!!)
[...]
Jornal: Esse é um dos motivos pelo qual o senhor diz que o professor está se afastando da sua função intelectual e sendo infantilizado no seu próprio ambiente de trabalho?
Professor: Começo com um exemplo: reuniões pedagógicas. Muitas vezes (nem sempre) o processo é o seguinte. O grupo começa rezando no espaço pretensamente laico da escola. Em seguida, faz-se a leitura de um "textinho" simplista de auto-ajuda, pontuados com uma ou duas frases soltas de um grande pensador, como Platão ou Voltaire. Depois se segue com uma dinâmica de grupo, que pode ser desde uma dança da cadeira até a brincadeira de passar o anel. No meio disso tudo discutem ações pedagógicas. [...] Como resultado, o professor, despido de sua função intelectual crítica, se tornou mera engrenagem no sistema. É podado e corrigido o tempo todo, como se fosse criança e não soubesse o que está fazendo, muitas vezes por pessoas que não são especialistas em sua disciplina. (Eu: Não suporto receber balinhas, bombons com aqueles papeisinhos cujas frases são utópicas!!! Eca...)
[...]
Jornal: Se o público escolar mudou, a escola também não deve mudar? Ela (a escola) não está em busca de ajustes para conseguir lidar com as demandas da sociedade contemporânea?
Professor: Não sou um nostálgico da palmatória e do chapéu de burro. Pelo contrário, acredito que a escola deve sofisticar seus métodos. Contudo, nesse processo, não se pode jogar fora elementos que sempre deram certo. A escola possui, sim, um importante papel de agregador social, mas não pode ser transformada em uma creche. (Eu: Governo e família, por favor, escutem isso: ESCOLA NÃO É CRECHE. ESCOLA É LUGAR DE CONSTRUIR CONHECIMENTO COGNITIVO!!)

Gente, que sistema educacional é esse que o menos importante é o conhecimento???
Que homens e mulheres serão amanhã as nossas crianças e adolescentes de hoje??
Eu quero condições de trabalho (segurança, materiais, respeito, salário digno etc.).

Para aqueles que não concordam com as afirmações do professor Ademir ou com as minhas colocações, eu convido para fazer uma visitinha a qualquer escola pública do país e constatar o que temos vivido.

Entrevista completa no site: www.tribunadoplanalto.com.br
Opinião/Entrevista/Ademir Luiz da Silva
Ano IV, Número 440
Goiânia, 18 a 24 de Outubro de 2009

6 comentários:

  1. Não é que eu queria ser o primeiro a comentar, mas numa dessas visitas aos meus vizinhos blogueiros decidi ir a sua "casa" primeiro. Só que como minha visita foi um pouco longa não visitarei ninguém além de voce hoje.
    Em relação à reportagem tenho, completamente, que concordar com o professor Ademir. No texto que eu escrevi uns tempos ai atrás eu até comentei sobre o lance da formação do docente. Hoje lendo está entrevista muito bem recheada com seus comentários percebo que preciso rever meus conceitos quanto educador. Sabe o que acho pior nessa história toda? A gente vai lá, faz o que pode e o que não pode pra que os alunos tenham o melhor ensino. Eles não dão a mínima, daí a gente vai embora frustrado e descrente da vida. Como você mesma disse a respeito dos alunos não serem capacitados para serem alunos, enquanto a gente se mata na faculdade para ser um (bom) professor.
    Olha esse é um assunto tão motivador que eu levaria tempo aqui. Por isso preciso encerrar minhas palavras, afinal amanhã irei ao treinamento. PROFESSOR-AMÉLIA(O)??? É o que querem da gente. Saio dessa de mansinho.
    Parabéns Rejane. Bom texto.

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  2. penso que vc escolheu sim uma bela profissão. Dentre todas as profissões, ser professor ao meu ver, é a mais importante, apesar de ser a menos valorizada. Pois, se não vejamos: Para existir um Albert Einstein, existiu antes dele seu professor que ensinou tudo a ele. Para aparecer um Miguel de Cervantes, alguém ensinou a ele escrever as primeiras palavras. Para ter um Mahatma Gandhi, existiu por trás dele um professor dedicado. Para aparecer um Abrahm Lincoln, um professor ensinou tudo a ele. Então, digo uma coisa Re... a profissão de professor é de fato a mais importante dentre todas. Já pensou na importância que é a de ensinar gerações? De influenciar (talvez) definitivamente na vida e no futuro de um aluno?
    Jà pensou nessa importância?
    E de fato extrema, apesar que, nossos governantes cada vez mais nada fazem pela a educação deste país e pela luta laboriosa dos professores.

    Não sou professor, nem habilidade ou conhecimento eu tenho para tal, mas sei que a profissão mais importante dentre todas é essa que você escolheu, portanto, parabéns.


    http://pcsouzabv.blog.uol.com.br/

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  3. Oi Rejane!

    Olha, o texto é fantástico emuito verdadeiro. quem o bserva a situação nas escolas, lê essa entrevista e discorda... Com certeza não vai muito bem das faculdades mentais.

    Texto primoroso. Adorei.

    Um beijão.

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  4. É uma realidade triste, triste mas realidade.
    Estão atribuindo tarefas aos professores que seiram dos pais.

    Abraço!
    Bom final de semana.

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  5. Aplausos ao professor Ademir. Ele falou exatamente o que penso. E foi por isso que não consegui ficar no 'sistema'.

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  6. Não é querendo estar contra,mas eu sou ALUNA,quando vc colocou em exposição os tais questionamentos "QUE ALUNOS SÃO ESSES QUE QUEREM TUDO MENOS ESTUDAR?QUE FAMÍLIAS SÃO ESSAS TÃO DESESTRUTURADAS E INRRESPONSÁVEIS EM RELAÇÕES AOS FILHOS?"Lembre-se vc lutou por isso,passou por vários obstáculos,mas eu tenho que te dizer uma coisa,essa é só mais uma fase da sua carreira profissional.Alunos não estudam porque não são incentivados?Ou porque não são orientados?
    Sinceramente fiquei muito chateada quando vc escreveu isso,esqueceu-se que eu também sou aluno???
    Mas eu concordo ,com o que foi dito em relação ao governo.E em relação a metodologia fula que é proposta pelo governo educacional.

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